"Ainda nom se tem explorado como se deve o potencial do ensino comunitário na recuperaçom do galego"
É possível educar totalmente em galego no ensino infantil, fazê-lo desde valores de solidariedade e respeito polo meio, e soster a aposta numha rede associativa voluntária e militante. Eis a proposta de Semente.
Antom Santos | Lugo, 16 de xullo. O processo desgaleguizador tem dado um acelerom mais do que preocupante nesta década que andamos. Trás umha relativa recuperaçom de usos e prestígio na viragem de entre-dous-séculos, os prejuízos contra o idioma afortalam-se nas elites e entre sectores das classes populares com renovada virulência. Frente a paralisia, um novo voluntariado educativo agrupado nas Sementes tem-se atrevido a desafiar esta tendência no elo mais fraco da cadeia: as crianças. Com determinaçom e vontade de edificar um modelo de nosso, as escolas de ensino galego pretendem demonstram que língua e valores podem ir de braços dados.
Mercedes Mourenza e Paulo Basanta som vizinhos de Lugo; as suas raízes estám em Muimenta e Guntim, em meios galegófonos. Pertencem a esse segmento de activistas da Semente que nom tenhem filhas em idade escolar, mas que vivérom em carne própria, e na da sua descendência, o drama de sentir-se alheios na própria terra. Este é um projecto de escolas de ensino galego, presente já em quatro cidades da Galiza, e que no curso vindouro oferecerá estudos de primária.
En Lugo, a escola está em Barbaim. Mercedes e Paulo falam da experiência. “Quando cheguei a Lugo há por volta de vinte anos -diz-nos Paulo- abraiava-me ver fatos de adolescentes que voltavam de aulas a falarem todos eles em espanhol; era umha cousa que nom estava afeito a ver na Terra Cha”. Mercedes, como tanta juventude do rural naquela Galiza urbana desleigada dos finais do século passado, chegou a cidade “a Lugo mui nova, estudei num colégio de monxas, e aqui o que havia era espanholizaçom pura e dura: falávamos todas castelhano por pressom, e quem falava galego, sofria risos e burlas”.
A sensaçom de desarraigo continuou anos mais tarde, quando chegou a hora de criarem as suas próprias filhas. Na Galiza do teórico bilinguísmo e plena consolidaçom autonómica, educar-se no nosso idioma nom é nem de longe um direito garantido. “No caso da minha filha, que hoje tem 23 anos, há sete, num aula de 24 alunos na periféria de Lugo, galegofalantes eram três; a pressom ambiental, por parte de professores e alunado, era tam alta, que se passavam ao espanhol”. O que conta Paulo retrata umha situaçom bastante generalizada, que chega mesmo a umha cidade que regista alguns dos dados mais positivos no uso e consideraçom do idioma. “A minha filha, que é da mesma idade que a do Paulo, o mesmo -continua Mercedes-, passou pola primária sem ter nenhuma companheira nem companheiro galegofalante”. Os constrangimentos de sempre continuam a actuar: “tanto na minha geraçom como na da minha filha, como na das crianças de hoje, domina a ideia que associa espanhol a mais êxito social, em todas as fasquias da vida. Ainda nom demos rachado essa associaçom”, conclui Mercedes.
“Domina a ideia que associa espanhol a mais êxito social, em todas as fasquias da vida. Ainda nom demos rachado essa associaçom” (Mercedes).
A consciência intuitiva dum pioramento da situaçom -logo ratificada polos dados- levou a Mercedes e a Paulo a um especial interesse polas alternativas educativas que puidessem garantir os direitos dos galegofalantes, com o intuito de reverter o processo de substituiçom. “Nós também vivemos na nossa nenez e adolescência os prejuízos sociais, os complexos… mas o que acontece agora é qualitativamente diferente”, afirma Mercedes. Mantendo-se em pé os tópicos históricos sobre a inferioridade do galego (e da própria Galiza), e com um quadro autonómico com quatro décadas de vida, que tem mudado? Esta é umha pergunta que muita gente se fai, e de cuja correcta resposta depende em grande medida o porvir da língua.
“Para mim -continua Mercedes- o efeito das novas tecnologias foi brutal. A cativada bota cada vez mais horas e horas ligada e pendente dum ecrá, e nesse espaço o idioma está quase ausente”. A observaçom coincide com a análise realizada pola Real Academia Galega num informe do passado mês de Fevereiro: a medida que a juventude se afasta dos espaços educativos e familiares, para se adentrar nos do lazer, o domínio do espanhol aumenta. Isso explica que, em novas geraçons educadas por pais e maes castelám falantes, e sob um ensino que manifestamente desfavorece a língua própria, o galego sone já, literalmente, a puro exotismo. Segundo os dados oficiais, no território autonómico, um terzo da mocidade entre os 20 e 30 anos nom fala nunca a nossa língua; parte deste segmento teria sérios problemas para expressar-se em galego com fluidez.

Mobilizaçom e alternativas
Há todo um território que explorar. Oposto a toda qualquer recriaçom no pessimismo, Paulo aponta razons para a ilusom. “Lembro muito bem momento em que a minha filha começou a ser consciente da problemática do idioma, coincidira com as mobilizaçons nacionais contra o chamado ‘decreto de plurilinguísmo’ que juntaram tanta gente em Compostela”. Com aquele Decreto 79/2010, os sectores mais supremacistas do PP compactaram as suas bases para reduzir ao mínimo a presença do idioma no ensino, conseguindo um bloco social pequeno mas enormemente agressivo, para deslocar o galego do centro das prioridades políticas e educativas. A involuçom legislativa, um autêntico ponto de inflexom para a língua, provocara porém um acordar da consciência que frutificara em manifestaçons massivas. Mas nom só. Entre a chuva de dados desacougantes fornecidos pola pesquisa sócio-linguística, alviscam-se contratendências esperançosas: a percentagem de monolíngües em galego detivera a sua diminuiçom em 2014, e mesmo registara umha recuperaçom tímida; e mesmo numha porçom importante da mocidade urbana castelám falante e indiferente ao destino do idioma, muitos dos clássicos prejuízos associados à lingua estavam-se a esvaecer.
Na pesquisa sócio-linguística alviscam-se contratendências esperançosas, mesmo numha porçom importante da mocidade urbana castelám falante e indiferente ao destino do idioma, muitos dos clássicos prejuízos associados à lingua estavam-se a esvaecer.
Por trás das cifras, como é sabido, estám centenas de milhares de histórias individuais, com as suas dúvidas, as suas vicissitudes e as suas apostas. No caso de Paulo e Mercedes, a inquedança idiomática frutificou numha atençom crescente a essas escolas de ensino galego que, com o nome de Semente, apareciam já nas redes sociais. O trabalho em internet, junto as primeiras jornadas formativas organizadas pola escola em Lugo, abrírom o caminho para ambos. O interesse estava aí, e faltava-lhe um pequeno empurrom para darem o passo ao compromisso organizado: “deu-se o acaso de que ambos os dous estudamos Português na Escola Oficial de Idiomas de Lugo; aí demos com umha professora, Maria Vilaverde, implicada na Semente desta cidade, que nos animou a participar”.
Ensino galego, de onte a hoje
Há um fio invisível que une duas etapas do movimento galego ao longo do tempo. Um decorre no tempo das Irmandades da Fala, quando Ánxel Casal Gosende e Leandro Carré Alvarelhos, lançam um inovador projecto pedagógico: as Escolas de Ensino Galego, com a vontade de enquadrar em chaves autóctones a formaçom das novas geraçons; um outro na presente jeira histórica, quando no seio da Gentalha do Pichel, centro social compostelano, jovens activistas decidem desenhar um modelo de ensino comunitário centrado “na aquisiçom, cuidado, conservaçom e consolidaçom” da língua. Com o modelo irmandinho como referente inspirador e umha filosofia declaradamente reintegracionista, militantes de distintos movimentos populares, muitos deles enfrentando-se ao difícil repto de garantir a transmisom geracional do galego com as suas próprias crianças, ponhem a andar um infantário com os sós recursos do trabalho voluntário e a autogestom.
A aposta tivo muito de valente num país, o nosso, cujo nacionalismo se liga historicamente à hegemonia do funcionariado docente, e onde propostas associativas à margem do sector público som vistas com desconfiança manifesta. “Temos vivido isto também em Lugo”, diz-nos Mercedes Mourenza; “ninguém, no ámbito nacionalista, se atreve a questionar abertamente a Semente, mas si existe um ruxe-ruxe em alguns ámbitos que extende o receio”. Ante a acusaçom de estarem a pular por um modelo de ensino privado que vira as costas às necessidades educativas das pessoas mais humildes, Mercedes resposta: “a Semente nom é ensino privado, desde que nom procuramos nenhum tipo de lucro; o que procuramos é apenas o bem social, e mantemo-nos com o trabalho voluntário e as quotas de pais, maes e activistas”.
A aposta tivo muito de valente num país, o nosso, cujo nacionalismo se liga historicamente à hegemonia do funcionariado docente, e onde propostas associativas à margem do sector público som vistas com desconfiança manifesta.
Qual é a acolhida social deste projecto, num país no que a tradiçom de ensino comunitário pro-galego nom se tinha ensaiado a fundo? Nom haveria umha resposta, pois na Galiza convivem realidades sociológicas muito divergentes; ademais, se existem Sementes já relativamente veteranas, outras estám quase na sua estreia. Compostela, com umha situaçom sociolinguística menos dramática que a de outras áreas urbanas, está a piques de ofertar também o ensino primário e pensa em ampliar a sua infraestrutura. O panorama que a Semente enfrenta em Lugo, onde o galego é a língua de uso frequente de praticamente a metade da populaçom, dificilmente se pode comparar com a que tenhem diante os activistas de Vigo ou Ferrol, onde o idioma nom alcança nem o 20% de falantes habituais. En Lugo, a Semente leva apenas dous cursos, partiu-se dumha pequena escola rural cedida polo concelho na paróquia de Barbaim, na estrada de Castro Verde, reabilitada com trabalho desinteressado do activismo.
“Fixemos um esforço grande por nos achegar à vizinhança, nom só com a oferta de matrícula, senom também com propostas formativas e lúdicas que nos deram a conhecer”, comenta Paulo. Até o de agora, os avanços som lentos, mas partem da constáncia e da firmeza. “Estamos nos inícios, e ainda imos demorar em que a Semente acade todo o seu potencial”, diz Mercedes. A inscriçom de novas crianças tem-se incrementado progressivamente, e o número de alunos do curso vindouro assegura, quanto menos, a viabilidade económica do projecto. A Semente mantém em Lugo um alto nível de actividade: revitalizou na zona festas tradicionais como o magusto, e tem organizado jornadas de temática muito diversa, desde aquelas nas que se ensina a fabricar brinquedos tradicionais, até cursos de formaçom do professorado. Todas as actividades estám guiadas polos princípios que Semente considera fulcrais e complementares à aposta polo idioma: o contacto com o meio e o entorno imediato, o laicismo, a coeducaçom e o assemblearismo.

As actividades estám guiadas polos princípios que Semente considera fulcrais e complementares à aposta polo idioma: o contacto com o meio e o entorno imediato, o laicismo, a coeducaçom e o assemblearismo.
Os obstáculos estám presentes: a atençom dos meios -além dos alternativos e da comunicaçom por redes sociais- é praticamente nula, à margem de informaçons puramente rotineiras. Aliás, ainda existe umha mestura de “desconfiança e desconhecimento” que mantém a certa distáncia sectores da sociedade que cumpriria contactar. “Algumhas pessoas consideravam que as dificuldades de conexom com muitas famílias deviam-se à nossa aposta na ortografia reintegracionista”, afirma Mercedes; “mas a experiência demonstra que isto nom é certo , o problema nom é esse: temos editado propaganda em ortografia ILG-RAG, por provarmos outra linha, e nada mudou quanto a assistência. Si que existe esse prejuízo contra o português, mas penso que com argumentaçom e debate pode superar-se”.
A falta de cultura associativa e o predomínio de dinámicas de inibiçom respeito ao conflito linguístico podem ser as chaves explicativas. Também a relativa normalidade com a que se vive o galego em Lugo, suponhendo um alívio evidente, tem efeitos paradoxais. Jacobe Pintor, um outro membro da Semente, na que escolarizou os seus filhos, explica a sua visom das cousas: “como a situaçom do galego é aparentemente boa em Lugo, muita gente leva a impressom que tampouco nom cumpre um grandíssimo esforço em favor da língua aqui, que a cousa nom está tam mal como para nos desvelarmos por isto. Mas a reflexom é enganosa, porque no fundo vivemos o mesmo processo substitutivo que no resto do país, ainda que esteja numha fase menos avançada. A minha nena, que está já na escola pública, é assinalada na aula por falar galego”.
Seja como for, manter o prédio em pé -no seu sentido literal e figurado- tem os requerimentos e exigências de toda causa colectiva nesta sociedade do individualismo e as pressas. “Erguer e manter isto deu-nos muito, muito trabalho”, diz Mercedes; “o mesmo trabalho ou até mesmo mais do que dá um centro social ou umha organizaçom militante”. Horas de tempo livre, preocupaçons, recursos económicos, longos debates… o projecto é absorvente e pede atençom constante. Vale a pena o esforço ? “Sem dúvida”, respondem. Mas levando em conta umha filosofia específica: “creo que historicamente, no nacionalismo e no independentismo pecou-se dumha visom demasiado produtivista, que só pensou no fazer e fazer, esquecendo a dimensom humana. Para poder fazer, tês que cuidar a gente que tês. Nom creo que seja a má fe, mas por vezes metemo-nos em dinámicas queimantes. Aqui, ao mesmo tempo que trabalhamos, procuramos que a cooperaçom e o cuidado entre as pessoas participantes esteja no primeiro plano. Assim é que funcionam as cousas”, esclarece Mercedes.
Sinérgias
Para além do debate suscitado por volta do carácter privado ou comunitário da Semente, a ideia da globalidade do processo normalizador nom é em nenhum caso questionada. “Obviamente, a recuperaçom do galego vai ter lugar por um esforço combinado. É errado pensar que o público e o comunitário estám em contradiçom”, afirmam os activistas. “Eu, por exemplo”, diz-nos Mercedes, “teimo em dizer que existe umha batalha muito importante por livrar em defesa da escola rural”. Neste ponto, a crise demográfica e a crise linguística cruzam-se de maneira evidente: o feche de centros considerados ‘nom rendíveis’ pola lógica neoliberal da Junta leva centos de alunas e alunos das escolas do rural a centros vilegos, onde passam a mergulhar num ambiente idiomático que nom é o próprio.
“A língua vê-se como umha luita secundária, e presta-se-lhe atençom escassa” (Paulo)
Mercedes e Paulo crem que o potencial da escola pública para a defesa do idioma é enorme, mas que reina a ‘deixadez’. A reivindicaçom do idioma nom ocupa, segundo os activistas, o mesmo lugar que todas as outras reivindicaçons, e isso leva inevitavelmente ao retrocesso. “A língua vê-se como umha luita secundária, e presta-se-lhe atençom escassa”. Ademais, acrescenta Paulo, “há muito professorado que nom o é por vocaçom, que está aí apenas polas condiçons salariais e laborais. Mais que nada som funcionários que se limitam a cumprir o horário e o programa”.
Pode-se conceber umha luita transversal e unitária, na que o professorado do sector público, com toda a sua incidência e recursos, trabalhe cotovelo com cotovelo com o voluntariado linguístico como o que activou as Sementes? Assim deveria ser, diz Mercedes; mas para isso nom serve falar só de maiorias sindicais nacionalistas: “o que cumprem som maiorias realmente conscienciadas”.
#lingua

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